HEMOFILIA – UM PROBLEMA DA MINORIA
Para entendermos melhor por que nunca foi criada uma política eficaz voltada para os hemofílicos, precisamos pensar politicamente.
Vamos começar pelos partidos políticos: embora os estatutos de todos eles sejam muito parecidos e defendam amplamente os direitos do cidadão, sabemos que os governantes atendem em primeiro lugar as necessidades dos grupos majoritários. Mesmo em se tratando de grupos majoritários, só são atendidos prioritariamente os grupos com maior poder de pressão.
É prioridade evitar o barulho, porque é o barulho que coloca em risco o prestígio do governante e é o barulho que, em todas as instâncias políticas, compromete o poder do político de se tornar majoritário e ganhar as próximas eleições. Por isto, muitas vezes um problema menos importante acaba sendo equacionado primeiro do que aqueles que embora graves, não geram pressão alguma sobre quem tem o poder de resolvê-lo. O próprio Congresso Nacional é mostra clara de que a maioria sempre vence. É tanto assim que ninguém, por maior prestígio que tenha, nunca tenta se eleger sem as coligações e outros conchavos políticos.
Qualquer ser que possui cérebro – por menor que seja – sabe que os mandatários resolvem primeiro as obras relacionadas com a terra: terraplanagem, pavimentação asfáltica e outras obras que ao seu término ficam expostas aos olhos do eleitor. Mas nenhum deles, por menos inteligente que seja, começa as obras do governo pelas instituições de saúde ou da educação, ainda que elas sejam a maior necessidade de qualquer povo e quase sempre a principal promessa de campanha.
Em nosso país já vi muitas vezes a realização de pavimentação asfáltica que, após o pleito político, acabaram quebradas para se realizar o que deveria ter sido construído primeiro – a canalização de água potável, esgotos e outros serviços públicos que obrigatoriamente ficam embaixo do asfalto. Na cidade grande isto ocorre com frequência: estamos sempre enfrentando problemas por causa das infindáveis quebradeiras de asfalto para realização das obras subterrâneas. Claro que isto se torna muito caro para a nação.
Mas o que eu disse tem a ver com hemofilia? Tudo. Temos visto a calamidade que ocorre na saúde pública brasileira. O Brasil tem mostrado para o mundo seu poder de crescimento, enquanto os seres humanos que pagam seus impostos mendigam atendimento em hospitais e centros de saúde sem nenhum sucesso. E a medicina de grupo privada está tornando-se cada vez mais poderosa.
A medicina através de sua metamorfose está virando de vez grandes empresas. Não acredito que este tenha sido o desejo de Hipócrates.
Fiquei sabendo, embora sem provas comprobatórias, que no Distrito Federal tem aproximadamente 500 hemofílicos – número alto para um lugar tão pequeno – mas que perde prioridade frente aos milhões de portadores de outras doenças que chegam aos hospitais, oriundos do próprio Distrito Federal e de outras partes do Brasil, o que não favorece os hemofílicos. Em saúde, a prioridade não deveria ser fruto de uma concorrência entre patologias e, sim, de uma política de saúde pública eficaz que visasse à prevenção de doenças e tratamento de qualidade para todos que dela dependem. Infelizmente tenho visto e ouvido em entrevistas com altos gerentes da área de saúde, perguntas até certo ponto agressivas por parte dos entrevistadores – que também devem sofrer ao assistir a calamidade da saúde pública do Brasil – respostas que demonstram a apatia dos que não sabem administrar muito bem o sistema de saúde pública, mas que sabem fazer muito bem todos os tipos de vinculação política, mesmo sabendo que o futuro para esses conchavos nunca será promissor.